terça-feira, 9 de agosto de 2011

Os Planos de Um Suicida - Relbier Oliveira

Esse instrumento é o Oboé... Bem, já não me importa mais a luta por fazer sentido. Olhe onde estamos. Olhe bem para onde estamos indo. Gosto da suavidade do som. É uma melodia triste, melancólica. É Bach?! Gosto de Bach. Aquele era o meu fundamento: uma estranha luz alaranjada, quente, confortável: pacífica, como nossa cama em manhã fria, quando temos que acordar logo cedo para mais uma das várias obrigações que tomamos ou que se impõe a nós. O que estou fazendo agora? Jogo xadrez online com um velho desgraçado que, sabe-se lá Deus o que está fazendo mais, leva um ano para fazer uma jogada. Minhas jogadas, como sempre, são irrefletidas. Não levam mais que 1 minuto. Daí então o jogo passa a ser um tédio. Eu só sei mover as peças, costumo dizer. De minha perspectiva, esse jogo consiste em dar o máximo de trabalho possível para seu adversário capturar o seu rei. É a visão do rato: ele nunca está em vantagem. Falar essas coisas sem sentido é tão mais sincero conosco mesmo. Deixar a imaginação fluir, contando as besteiras que seus dedos e sua consciência tentam acompanhar. Bem ditos sejam os surrealistas! (Fiz de propósito).

É engraçado como nos acotovelamos nos ônibus e em outros espaços públicos e/ou coletivos. Digno de deixar qualquer cristão entristecido. Ou qualquer um que, direta ou indiretamente, consciente ou inconscientemente, fundou seu conjunto de valores, a construção do seu mundo, em cima de valores que, em qualquer (boa) medida, considera o humano. Não é estranho que qualquer coisa haja por necessidade, por implicação de alguma determinação anterior a ela, e assim por diante. Movemo-nos sempre por nossos interesses. Por que o sal de cozinha se dissolve de tal forma igualitariamente no meio aquoso? Por que a água do rio corre para o mar (ou, antes, para os lugares mais “baixos”?). O que significa o tal arco-reflexo de nosso corpo? O que é a fome, ou aquela sensação que nos incomoda a barriga? O que significa se remexer na cama durante a noite em busca da “melhor” posição? Onde estão as determinações mais íntimas, mais específicas? Aquelas, que não damos conta de apreender e compreender, e na qual armamos um circo de possibilidades? Entristece-me profundamente quando os valores das pessoas começam a se encrudecer, a criar forma, a se constituir. Pois então o mundo delas se forma também, e tudo o mais, todas as possibilidades, desaparecem. Tudo passa a responder mecanicamente ao padrão doravante estabelecido. Quero que descubram um dia que, de fato, eu não era belo, mas também que ninguém era mais belo do que eu. Quero que vejam que toda beleza que são capazes de encontrar no mundo, encontrariam também em mim, assim como todas as feiúras. Sabe por que eu gostava de Dragon Ball Z? Por que nele existiam espaços que não tinham donos, pessoas que eram diferentes e tinham suas diferenças respeitadas e consideradas. Identificava ali traço de humanidade, qual seja, a possibilidade na diversidade. Plano de Imanência... Fala sério, essas coisas todas eram invenções do Orlandi (e de quem em quem ele realmente viu sentido: qualquer um, menos Deleuze propriamente).

sábado, 30 de julho de 2011

O Bulling Institucional - Roni dos Santos

Existe no espírito do brasileiro uma coisa que agente chama de cordialidade. Esse comportamento consiste em apagar do meio cotidiano qualquer vertigem de disputa, agressão ou violência, as vezes pior que isso, supor que essas três coisas são iguais. O medo de qualquer perturbação e desordem aos valores sociais e a moral herdado da nossa falsa igualdade e democracia, permite que a nossa sociedade cometa as mais diversas formas de perversidade possível.

Por que eu estou dizendo isto? Quando eu era moleque, cursando o primário, não faltava quem gostasse de “tirar um barato” de mim, mas também foi assim que fiz muitos amigos. Naquela época como hoje, se você tinha a cabeça grande, o nariz grande, o pé grande, qualquer coisa grande, coitado. Se era branco demais ou simplesmente negro, “tadinho”! Qualquer diferença notadamente extraordinária, que inúmeras vezes vinha carregadas com um preconceito certamente trazido de casa e com contribuições da sociedade, você era uma vítima em potencial da “zoação”. No entanto, os mesmos moleques que “zoavam”, também eram “zoados”, e no fim da aula íamos jogar bola, tomar tubainas e ficar remoendo o infeliz apelido, até que aceitávamos o famigerado nome social para aquele meio. A diferença para os dias de hoje é que temos um nome bonitinho para isso, se chama bulling. Essa é a maior piada do século, por que se tem um lugar onde a estupidez de uma parcela limitada de pedagogos limitados se faz estúpida é na hora de aplicar práticas surgidas de outros contextos ao nosso contexto. Ao contrário do que se espera, identificar tal ato não inibe a prática, ainda por que o bulling identifica e normatiza o individuo que pratica uma determinada modalidade de violência contra outro individuo, ou seja, ela é antes de tudo um bulling das instituições pedagógicas contra os “maus alunos”. Mas quem nunca praticou um “bullingzinho”? Então somos todos “maus alunos”?Eu tô dizendo isto por que eu vi um moleque chamar uma menina de gorda, o que de certo é constrangedor, logo a direção da escola ficou ciente do ocorrido e quando foram chamar o menino para esclarecer o assunto, foram logo avisando, “cara, você cometeu um bulling”. De um momento para o outro o moleque era o maior criminoso do mundo, por um momento de fúria somado a todo o preconceito ensinado pela sociedade mais um aparelho institucional que tem por função normatizar, o moleque se fodeu. Na minha opinião, este é o bulling institucional, que é fazer do indivíduo aquilo que ele não é. Mas como é que se caracteriza o bullyng da maneira como vemos descrito cotidianamente, isto é, como ele é entendido pelas práticas escolares, mídia, formadores de opinião e gente sem ter o que fazer? O bulling se caracteriza pela prática de violência física ou psicológica em indivíduos ou grupos minoritários. Mas que tipo específico de violência estamos falando? Qualquer uma? A psicanálise define – grosseiramente da minha parte – pelo menos duas formas de violência: a ação que tenta destruir um determinado objeto de desejo e àquela que nasce pela diferenciação entre pessoas e grupos, que está muito mais ligado a disputa ou agressão. Podemos considerar que a primeira é destrutiva, por que ela é irracional, ela não destrói só o objeto, mas destrói o individuo que a alimenta, por que ela nunca terá fim. No caso da segunda, podemos situá-la em um campo construtivo, isso por que a disputa e a agressão também servem não somente para diferenciar os indivíduos, mas para colocá-los em relação direta e quem sabe para nomeá-los socialmente junto ao grupo, chamar pra jogar bola, tomar tubaína e outras coisas que pessoas fazem em grupo e não em bando, – a ideia de bando também é uma forma de sujeição, é a tentativa de descaracterizar a individualidade das pessoas que compõe um grupo, como de ladrões - ou seja, não é só a igualdade que aproxima, mas a diferença também.Portanto, se existe uma violência destrutiva, ela também parte das mais altas instâncias institucionais.O efeito do bulling é o exemplo clássico de que toda forma de disputa e diferenciação, independente que posição ela ocupe, tem de ser abolida. Não estou fazendo defesa da prática, mas se formos cuidadosos, podemos perceber que o sujeito que prática o bulling foi inventado. É o nosso medo de perturbação da ordem, é uma forma que os pedagogos têm para dizer quem é que pode disciplinar quem. Não se diferiu as diversas formas de violência em nome da violência institucional. Logo, inventou-se também uma forma de dizer o que é politicamente correto. Mas ao passo que nos indignamos com essa postura politicamente correta, a única opção parece ser a atitude politicamente incorreta, ou seja, o trote pelo trote, a piada pela piada, sem outros fins.O grande problema é que o politicamente incorreto também não supera a violência banal, ela traz consigo àquela carga de preconceito através da dominação e sujeição sobre o outro, ela é a outra face da mesma moeda, ou da nossa cordialidade. Ela não nasce da vontade de conhecer e integrar o outro, mas para satisfazer o próprio ego. Então aqui persiste o nosso espírito covarde, por que é uma postura que tende a tornar explicito aquilo que era implícito, ou seja, ele continua a destruir nosso objeto de desejo, mas agora com o rosto de uma mulher, de um gay, um negro ou qualquer ser diferente. Nosso espírito cordial também se manifesta quando aparece um vídeo na internet de um menino “gordinho” respondendo ao bulling que vinha sofrendo, deliramos de tesão e emoção nos sentindo representados pela reação do garoto, sentimento similar ao nosso desejo de vingança, vizinho do ressentimento, por que nos julgamos e somos incapazes de fazê-lo por conta, mas queríamos fazer, isto é, por um instante somos heróis sem ser, gozamos como pau dos outros.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Embate... - Arnaldo Silva

Existe um tempo
Na sua vida
Que tudo é perfeito
Tenho certeza…
As cores são fortes!
O som vibrante
O perfume agradável
As formas são lindas.
Seja de um corpo
De um lugar
De um momento
Ou até de um desejo
Este tempo não é o atual
Assim passado e futuro
Travam uma luta desigual
Com o presente para tomarem seu lugar
Nos iludimos por não saber
Quem hoje ganhou a batalha

sábado, 23 de julho de 2011

Alguém para amar - Relbier Oliveira

Alguém para amar, queria Mercury (o Freddie). Dizia ele que apesar de ser amado por milhares de fãs, sempre se sentiu sozinho. Alguns dizem que o amor é como toda panela, para toda qual sempre há uma tampa; e assim, para cada pessoa há outra, a quem se amará e por quem será amado. “Você existe, eu sei”, dirá Bruno Gouveia: toda laranja partida tem sua metade complementar, todo chinelo velho acolhe justamente um pé cansado, e assim por diante. Saberes populares sobre um campo da vida humana poético, filosófico, científico, religioso e tudo o mais, o amor, ou as relações romântico-afetivas. A voz do povo é a voz de Deus. E quem sou eu para discutir com Deus? Na verdade, eu quero crer que ele está certo. Eu torço para que esteja certo, tenho fé e esperança nisso. O pedante arquiteto de nossa Matrix (que não é Deus, espero eu) diria que esta última, a esperança, é ao mesmo tempo nossa maior fraqueza como também fonte de onde emanam nossas maiores forças. Para não ter que ir muito mais além, seria essa a dialética que nos põe em movimento? Ou não, talvez seja isso reduzir demais a essência humana, radicalizando desnecessária e perigosamente o raciocínio – o que me faz lembrar um novo amigo, que tem esse defeito. Mas já nos afastamos demais do assunto primeiro.

Uma dúvida me tira o sono (eu, que estou solteiro [solteiro sim, porém sozinho nunca... aff!]); essa dúvida me lança em pesadelos, me faz delirar, suar e estrangular meu ursinho Puff com um forte abraço de pavor (sim, porque na minha época se chamava Ursinho Puff, e não Pooh!): pode mesmo, na vida, um indivíduo desgraçado passar ao largo da sua alma gêmea, tal qual Freddie? Porque o saber milenar exotérico da própria voz de Deus diz apenas que para cada qual há o seu, como naqueles diagramas de Venn. Não diz que o par necessariamente deva se encontrar na vida. Talvez seja meramente provável que eles devam se encontrar (e isso tudo porque não quero colocar em dúvida aquela afirmação [supostamente] proferida por Deus, da qual partimos).

Mas então, o que viria a determinar o desencontro dessas almas (ou, antes, seu encontro)? Quem decide pelo fim que terá essa dupla jornada? Somos nós, em alguma medida, responsáveis pelo o que virá a acontecer? Se eu ficar parado, escondido, em algum ponto solitário dessa terra, no mais longe que eu conseguir me refugiar, terei eu a sorte de esbarrar com minha metade? Por outro lado, haveria algo que eu pudesse fazer para otimizar esse desenlace?

Apesar de tudo o dito, enquanto tem uns que choram por não ter encontrado ninguém para amar, parece, de outro modo, haver outros que não só encontram seu complemento como também seu suplemento. E assim eu me pergunto: exceto aqueles casais romanceados de ficção (telenovelas, literaturas e fantasias juvenis), de única entrega na vida (e entrega mútua – oh, sei: tratam-se daquelas figurinhas que sempre faltam para fechar o álbum), acaso nos divertimos com a metade dos outros ou há mesmo alguns outros que vêm ao mundo para não terem metade? Que medo!

Parece, pois, tão tentador considerar que não haja regras para esses assuntos, mas seria pior, e eu quero acreditar. Se encontraram regularidade nos resultados advindos do lançamento de uma maldita moeda, por que não no amor? [Retórica].

Talvez a explicação para esse enrosco pseudointelectual, que vislumbra uma regra para os assuntos do coração, seja a seguinte: parece haver uma regularidade, as pessoas apenas ficam sozinhas se só quiserem um amor perfeito, do tipo ideal. A ideia desse tipo de amor, por sua vez, deve ser fruto de algum virgem que escrevia bem e tinha boa imaginação, mas que provavelmente nunca experimentou a desgraça que é se relacionar realmente com alguém. Essa maldição foi posta em todos os demais como uma cenoura amarrada na cabeça de um cavalo, estando ela a meio palmo da boca do infeliz, que a persegue faminto, cego e sem razão. Todos, a princípio, foram feitos para todos; e por intermédio de algumas contingências ambientais (bah!), moldaram-se e selecionaram-se os gostos. Quem pode mais chora menos, e assim por diante. Ou seja, a sua metade é fruto da surra que você levou da vida.

Mas não. Talvez essa revolta toda seja fruto de frustração, “máquina de fazer vilão”. E tudo começou porque o Freddie, assim como eu (e todo o mundo, provavelmente), queria ter alguém para amar. Pode ser que a culpa não seja do virgem. “Vai que essa ‘lenda’ do amor ideal não esteja dentro de todo o mundo desde sempre!”. E certamente uns e outros dirão “eu conheço alguém que viveu um amor assim”, ou, “eu vivo um amor assim!”. Eu espero, francamente, que isto seja verdade, que esta espécie de amor seja possível. Que seja a esperança motor das minhas maiores forças; que a voz do povo seja a voz de Deus, e que portanto eu ache a minha metade da laranja. Pois dói só de pensar que o que sobrou pra mim foi só “o bagaço da laranja”.

OBS: Por favor, respeitem a minha metade da laranja: não faça com a metade dos outros o que você não quer que façam com a sua!

terça-feira, 19 de julho de 2011

Quandos - Relbier Oliveira

Eu sou

O seu passado distorcido

Seu futuro

Sou seu tudo

Eu quero

Que pelo menos fosse desta vez

E faço o que sei fazer

Tudo quanto quero ser

Basta eu quero e eu sou

Juízo! Escondido com medo da chuva lá fora

Duvido! Que você possa saber

o que eu estou sentindo agora

Eu sou seu futuro

Eu quero e faço o que sei fazer

Tudo quanto quero ser

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Propriamente Dito - Relbier Oliveira

Quando a noite cai e o silêncio de nós mesmos vem nos conversar

A impressão que dá é que nunca vi mais gordo

E a saudade do que não aconteceu:

Uns chamam de fraqueza

Eu, como Lulu, digo: que seja fraqueza então!

Minha pessoa com muito a fazer

Mas quem vai fazer por ela? Quem?

Meus nervos, meus músculos; minha carne, minha alma:

Eu todo tremo e me espremo

Mas não uno necessariamente o que sinto com palavras

Para não pegar-me [a mim mesmo] desmentindo a mim

Por qualquer figura de linguagem

E fim.

sábado, 9 de julho de 2011

Apocalipse Now

Título original: (Apocalypse Now)
Lançamento: 1979 (EUA)
Direção: Francis Ford Coppola
Atores: Marlon Brando, Robert Duvall, Martin Sheen, Frederic Forrest.
Duração: 148 min
Gênero: Guerra
Status: Arquivado
Normalmente, os filmes cujo roteiro é adaptado de alguma obra literária costumam importar o título do produto original — às vezes, com pequenas alterações. Mas, em 1979, o americano Francis Ford Coppola não incorporou nenhuma referência explícita ao clássico “O Coração das Trevas”, de Joseph Conrad, no belíssimo “Apocalypse Now”. Preferiu aludir ao livro nos minúsculos detalhes da trama e, sobretudo, no plano superficial do roteiro, importando os aspectos básicos da narrativa e recobrindo-os com a plataforma histórica da Guerra do Vietnã. Assim, o diretor reconta a trajetória do capitão Benjamin Willard (Martin Sheen), recrutado pelo Exército dos Estados Unidos em Saigon, capital do antigo Vietnã do Sul, para assassinar o lendário coronel Walter Kurtz (Marlon Brando), que criou uma sociedade ‘alternativa’ no coração da selva asiática e não obedece às determinações ocidentais.
No curto livro de Conrad, publicado inicialmente em 1902, o universo que abarca o enredo é o imperialismo europeu na África, mas os principais pormenores da narrativa consistem nos mesmos incorporados por Coppola. O protagonista, Charles Marlow, é um veterano marinheiro ancorado em Londres que, saudosista, rememora um antigo trabalho realizado para uma empresa que explora a extração de marfim no Rio Congo, nas profundezas do continente africano. Contratado pela companhia, Marlow viaja até o local para resgatar um lendário comerciante Kurtz, um ícone da região que abandonou os hábitos mercantis e instaurou uma sociedade distinta no coração da África. O centro do romance é o percurso efetuado pelo marinheiro até encontrar o objeto de desejo – uma viagem que causa, no personagem, uma densa transformação psicológica e denuncia os absurdos da colonização europeia.
Sinopse copiada de: http://livroseafins.com/adaptacoes-livros-cinema/

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Tardes de Julho - Arnaldo Silva

Para alguns sou uma lembrança, algo ali entre o presente e o passado. Se não fizer algo, serei realmente um ponto distante em algum dia sem data certa. Isso pode me ser útil, mas é triste. Não ter disponibilidade para ser presente e futuro é algo que pode me transformar em alguém insensível. Para outros sou presente, mas não um presente com passado. Um presente construído em uma conversa, um favor, um olhar, um relacionamento profissional. Se questionado, talvez ninguém saiba nada sobre o que me fez até o presente. O que sou é reflexo do meu passado remoto que talvez esses outros não saibam. Mas para poucos, sou um presente com passado. E esse passado chega a pesar tanto que ofusca quem sou no presente. E acabamos visualizando alguém que existe em função deste passado. Então mesmo presente sou passado. Um ou outro, me vêem como futuro. E como futuro sou uma incógnita, pois meu presente não afirma meu futuro. Assim sendo, para um ou outro, sou uma promessa. Talvez uma promessa de ser presente ou de ser um bom passado. É um desejo mutuo, pois hoje eu não quero ser presente e dessa forma torno impossível existir um passado, restando apenas a esperança de ser futuro. Graças a nossa capacidade de remodelar o passado, posso ser futuro a partir desta releitura. É frágil, mas é possível. De qualquer forma, gostaria de ser presente de todos no futuro.

domingo, 3 de julho de 2011

Oração da Noite e do Dia Seguinte - Relbier Oliveira

Oh pai senhor celestial

Que intercede por nós através de tudo

Através da força da natureza e do sol

Que interfere em nossas vidas através da vida alheia

Que faz de nós bons para o mundo e para a sociedade

E que nos faz o espírito saudável para tanto

Que não nos permite a demasia sentimental

Que rege nossos caminhos a fim de nossa felicidade

Curai minh’alma e meu pensar

Livra-me do fardo da incerteza

Falai conosco para não mais sentirmo-nos sós e loucos:

Como alguém que pára horas a falar consigo

A achar que fala com Outro

Permita essa loucura ser sanidade (!)

Para que não caiamos no vazio da inexistência

E sejamos dignos de nossa posição atemporal

Da realidade puramente racional e humana

Para todo o sempre

Beleza!

( )

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Das redes e da amizade como modo de vida - Roni dos Santos

"Todos vós, que amais o trabalho desenfreado (...), o vosso labor é maldição e desejo de esquecerdes quem sois." Nietzsche, Assim falava Zaratrusta.

O que eu prezo em uma amizade é o tempo ocioso, “fazer nada junto”. A capacidade que uma pessoa tem dedicar seu tempo para não fazer nada com outra pessoa, mesmo que for para ficar em silêncio. Ao contrario do que algumas pessoas pensam, o silêncio é sagrado, o silêncio não é a ausência de comunicação e interação, mas a possibilidade que se desenvolva outros meios de linguagem.

Neste momento de nossas vidas vivemos um estranho paradoxo, quanto mais se desenvolvem a ciência e a tecnologia, mais sentimos um vazio existencial, quanto mais produzimos para sobreviver, mais “subvivemos”. Parece que a única possibilidade de sentido coletivo seria montar um personagem em meio às redes, para que sejamos alguém ou, no caso das relações fora das redes, interrompermos brutalmente os silêncios – seja com o fone de ouvido no buzão, ou a necessidade de falar desesperadamente sem parar – na tentativa de esquecermos quem somos. Em particular no caso das redes, quanto mais nos conectamos a elas – fruto desse desenvolvimento tecnológico – mais nos isolamos. Notei pela seguinte frase que peguei pela NET: “A internet tem esse estranho paradoxo, de aproximar quem esta longe e afastar quem esta perto”. Então eu me pergunto se isso realmente é verdade. Imagino que as sociedades em redes são, antes de qualquer coisa, ferramentas a serem manipuladas pelo homem, se os homens se alienam nelas é muito mais por consequência de algo maior do que por razão das redes em si.

Lembremos que antes das sociedades em redes já existia um processo de isolamento dos indivíduos, o século XIX é um processo de disciplina que encerra o homem em uma relação espaço-tempo, isto é, a criança e o pedagogo na escola, o trabalhador na fábrica, o médico e o paciente no hospital, todos eles têm de obedecer a uma regulamentação temporal dentro de um espaço definido para sua função. Com um tipo de comportamento que tem se aproximado de uma sociedade de controle, a sociedades em redes são perfeitas, pois é possível que o indivíduo se movimente temporal e espacialmente, mas o que não quer dizer que não haja um ponto de controle sobre ele. Em última instância, podemos dizer que o fim último desta sociedade não é o homem, mas sim uma autoreprodução dela mesma de forma alienada. Quando a ciência e tecnologia, mais especificamente as sociedade em redes que produzimos, não serve como ferramenta, mas tem o homem como sua ferramenta de desenvolvimento, senhores, sim, ela é alienada.

Portanto, da minha parte como tentativa de resistir a essa investida, não me preocupo com uma produção de interesses que tenta reproduzir este tipo de sociabilidade. Procuro amar loucamente a minha imagem naqueles que estão com a mesma disposição, seja respeitando seus silêncios ou as diversas formas de manifestação ou linguagem. Por isso, eu não sei qual a distinção entre amor e amizade, isto por que amo meus amigos e procuro ser amigo dos meus amores, isto define minha concepção de “amizade como modo de vida”. Em homenagem à família Bad Fur Day. http://porumaportaiconoclasta.blogspot.com/

sábado, 18 de junho de 2011

[Folhetim ainda sem título] (PARTE 2) - Fernando Xavier & Relbier Oliveira

Ao se separarem, Fábio indaga:

— Até não faz muito, queria se casar comigo; agora sou só teu amigo?

— Do que está falando, hein?

Fábio, sem mais, deu-lhe as costas e saiu do metrô. Foi-se embora para casa. Felisberta, sem se importar muito com tal atitude, continuou sem rumo determinado seu caminho. Até que se deu conta: “Mas, que burro! ‘Amigo’ era o José!”. Já era tarde, Fábio já estava pensando besteiras à mil. Acontece que Felisberta, quando da apresentação, confundira as mãos ao apontar quem era o “amigo” da apresentação. Quem era o que não era “amigo” então?

Sempre avoada, Felisberta permitiu-se seguir os devaneios que tal problema lhe apresentava, e seus pés pareciam mesmo seguí-los “na realidade”, pois ela trilhava caminhos nunca dantes trilhados.

Noutro ponto daquela megacidade, Fábio entrava numa pocilga recém-inaugurada, absorto em pensamentos sórdidos por conta de tão pouco ou nada. Pensava “amigo?! Depois de tudo o que passamos! Amigo?!”. Sentou-se no balcão. Pediu uma dose, ao que, depois de a moça servir-lhe em um daqueles copinhos menores do que os americanos, disse: “A garrafa. Esta titica pode ficar pra você, eu pago!”. A moça, que não parecia muito feliz com nada aparente, retrucou: “Não bebo, senhor. Você pediu uma dose, afinal. Se querias mais, devia ter pedido outra coisa!”.

— Olha, moça, meu dia já não está muito bom. Aceito o desafio: vou discutir com a senhora.

Não demorou muito, e os irmãos truculentos daquela “senhora” estavam rearranjando a mobília do estabelecimento por conta da movimentação dos primeiros (ou, do primeiro) cliente: Fábio fora arremessado em várias direções, contra diversas mesas e prateleiras. Copos que se quebravam, garrafas que se preservavam apesar de caírem “altamente” no chão. Gritos, sangue, palavrões! E estava sendo mesmo um sucesso a inauguração: os transeuntes, enfim, paravam para olhar. Lotavam os arredores. De fato, a propaganda anda mesmo cada vez mais agressiva!

Ao ser arremessado contra-sobre-ralando no asfalto quente do finzinho de tarde, e após quase ser atropelado por uma moto, Fábio, ainda meio tonto, levantou-se aparentemente risonho e feliz. Bateu nos bolsos da calça, meio que levantando a camisa, buscando algo sob o seu cafona paletó cinza com forro azul, ao que, para o espanto de alguns, verbalizado em gritos como “Meu Deus, ele tem uma arma!”, mostrou ser meramente a busca por seu celular. E tal (o objeto contraditório) de repente apareceu na cena em uma trajetória não-retilínea uniforme, traçando uma parábola, arremessado lá de dentro da pocilga, espatifando-se, tal qual o dono, no meio da rua, findando-se, diferentemente dele, com o feliz (?!) esmagamento por um ônibus, tirando, enfim, aquele sorriso insolente da sua face. Atônito, Fábio permaneceu por alguns instantes admirando a estranha cena, analisando o corpo mais inanimado que nunca do seu celular, pensando se ainda devia recolhê-lo ou não. Em verdade, talvez aquela fosse só a deixa para que ele enfim tomasse vergonha (na cara) e trocasse aquele démodé aparelho.

Não demorou muito (afinal, o clima ali não era dos mais amenos), Fábio tornou a seguir seu caminho, que, a princípio, o conduzia à sua casa, mas que, agora, já não estava tão certo assim.

Na esquina, Fábio encontrou um telefone público. Bateu a mão no bolso traseiro da calça para apanhar sua carteira, a fim de retirar um cartão, mas deu-se conta pela falta dela: “Ora, foda-se: carteira e cartão são para os fracos!”. Á base do 9090, tocou no celular de Felisberta, que, à essa altura, gemia loucamente na cama de um desconhecido. Freou o desejo por um instante sob o corpo suado de um rapaz de não mais que 15 anos afoito pela ejaculação, estendeu seu braço esquerdo em direção ao celular sobre o criado mudo e, vendo o número, desligou-o em seguida, tirando-lhe a bateria e arremessando suas partes sobre o carpete da porta. Aquilo era um motel, desses dentro do centro da cidade, às margens de uma grande, feia e suja avenida; próximo ao rio podre.

Felisberta, então, intentou sair de debaixo do rapaz, que impedia-lhe instintivamente, como um cão que prende a cadela com suas patas dianteiras trêmulas de cansaço: “Olha, moça, eu ainda não terminei. Se queres a grana, seja boazinha”, disse o rapaz.

— Olha, fala como um homem que estivesse mesmo sobre o controle da situação! – zombou-lhe — veja só: eu só estava sem o dinheiro para um café. Mas acontece que já me passou a vontade; agora estou a fim de fumar, e cigarros eu tenho. A propósito, dinheiro nunca foi problema pra mim, dinheiro é a solução. Se estou aqui agora é porque quero, não por que precise (muito). Agora, me deixe ir embora, tenho assuntos pra resolver.

— foda-se, dona – respondeu o rapaz ofegante e já exaltado — não quero saber da sua vida, quero só te comer. E eu não paguei essa porra à toa.

De repente, começou uma sessão tensa de agressões. Felisberta tentava desvencilhar-se das garras do inexperiente garanhão, e este, por sua vez, como se estivesse sobre o efeito da privação de alguma droga (o sexo, obviamente: quem nunca sentiu os efeitos da ameaça ao coito no psíquico?), não media a consequência dos seus atos e, ao contrário, entregava-se insanamente a eles. Àquela altura, já não importava mais nada: seu prazer estava ameaçado, e ele estava disposto a ir até o fim para defende-lo. Mas resolveu ir além. Tendo conseguido imobiliza-la debruço na cama, não contente com a salvaguarda do seu prazer imediato, tirou o preservativo e principiou a violá-la por vias não costumeiras, ao que ela balbuciava algumas palavras de desaprovações misturadas com gritos de dor, pânico e afins.

[Folhetim ainda sem título] (PARTE 1)- Fernando Xavier & Relbier Oliveira

Tinha dito o quanto desvanecido estava:

— Olha, estou muito desvanecido...

Mas tinha dito também o quanto não era mais ele mesmo:

— Meu caro, eu não vou repetir o que eu disse...

A passos largos, ia para o quintal, e a passos largos, voltava para a sala. Há meia hora esperava a bendita e ela nem sinal! Mas que afronta! Que disparate! E tragava mais e mais o cigarro.

— Pelo amor de Deus! A gente combina um horário, mas ela não respeita, nunca respeita!

Meia hora depois a fulana abre o portão afoita:

— Ei meu bem, trago boas noticias: O Bonifácio me entregou o malote! Vamos para Paris!

— Aehh! Prepare as malas! Vamos hoje mesmo!

— Demorou!

E assim foram para Paris. Viajaram pelo Chateau de Versailles, pelo Centro Pompidou e pelo Museu Rodin. Agora eram chiques, não podiam mais comer um bife à milanesa sem lembrar do Petit a Gateau.

Mas foi na volta para o Brasil (Ah... que volta!) que aconteceu o que interessa nessa história.

— Olha, meu bem, não deixemos o navio naufragar, não fiquemos a esperar as curvas da estrada... Você sabe, e eu sei... Devemos nos casar, Imediatamente! Nós nos amamos, não? Então porque deveras devemos esperar mais? Eu durmo na tua casa todo dia, quase. Pago aluguel á toa... Vamos juntar nossos panos de bunda e ficarmos bem!

— Mas que maneira mais insensível de pedir alguém em casamento!

— Ah, não vem querendo dar uma de romântico porque tu não é!

— Aff

— E outra coisa, você não tem outra opção! Ha-há-há...

— Que engraçado. Há-ha... Só você entendeu a piada.

— Sem graça.

Mas essa história não é assim uma regra: um romance brega, careta, típico tema musical moderno... Não! O que acontecerá adiante mudará a história da humanidade! Mudará os rumos da sua vida! Sentirá os efeitos: o boi pastando no pasto, a coruja corujando no poste, o cavalo cavalando no celeiro e o homem trabalhando em qualquer lugar.

— Ó, vida celeste! Céus azuis. Meretrizes em chamas!

— Ó, canavial medonho! Vidas breves sem carinhos tortos!

— Ensina-me, como a teu rebanho, onde está o segredo do teu sorriso sem motivo!

— Ó, ensina-me a viver! Tu que sabes que viver é arte. É técnica e ao mesmo tempo privilégio!

— Conversa de doido!

— Pois é.

No metrô, os atores e atrizes desempenhavam o suficiente para as moedas...

— Eu não vou dar um centavo pra esse povo.

— Eu vou dar uns trocados. Tem que ser muito corajoso pra ser assim tão idiota.

— Há-há-ha.

Mas um dos atores olhou para a moça de vestido de seda azul a meio palmo acima do joelho com um decote bem trabalhado para sensualizar qualquer ocasião.

— Ei!

— Oi?

— Você não é aquela moça que viajou comigo para Foz do Iguaçu? Felisberta, não é mesmo?

— Sim, sou eu mesma! Que coincidência, hein.

— Pois é!

— Esse é meu amigo, José. José, Fabio, Fábio. José.

— Prazer.

— Prazer.

— Olha, vou indo nessa, tenho muitas coisas a fazer, como você mesmo pôde testemunhar, ha-ha-ha

— Eu tô vendo. Mas olha, um conselho: melhore esse texto. Tá feio, hein.

— É um artista da Grécia antiga, coisa fina.

— Então deixa e fala pra todo mundo que era da Grécia. Quem sabe o povo não começa a gostar.