Shantiti
era já uma mulher formada, mas se vestia como a uma criança. De baixa estatura,
talvez um metro e meio ou mais.
— Mas... Quantos
anos você tem, menina?
—Tantos quantos
você queira.
E disse
ainda ao homem, para o qual entregou o pequeno envelope vermelho:
— Não abra, eu
já sei quem é a vitima. No caminho pra cá, não resisti e li. A vitima sou eu.
O homem
riu sadicamente. Primeiro, pensou mesmo que ela pudesse ter lido, mas terminou
por considerar que não, já que ninguém seria louco o suficiente para entregar
ao seu algoz a ordem de sua própria execução.
Ao
abrir o envelope vermelho, do alto de sua arrogância intelectual, explodiu com
ele em mais de mil pedaços. A pequena Shantiti, que ainda estava
suficientemente próxima, não escapou de ser arremessada longe na sala escura do
amplo apartamento. Caiu próxima às janelas, que se arrebentaram com a força da
explosão, permitindo que a luz do dia ensolarado lá fora invadisse o ambiente
interno como que numa inundação. Coberta pelo sangue da outra vitima, Shantiti,
com dificuldade e atordoada, pôs-se de pé. Testou os movimentos da mão direita,
como que admirada. Ajustou as duas xuxas dos cabelos e por fim olhou em volta,
contemplando a estranha e caótica cena de destruição. Voltando-se para a
janela, apoiou a mão direita num pontiagudo estilhaço ainda preso, perfurando-a
num corte largo. Emitiu um grito pavoroso, que aparentemente a fez despertar. Neste
instante, alguns vizinhos do apartamento arrombaram a porta a fim de socorrer
possíveis feridos. Foi quando Shantiti lançou-se do alto do sétimo andar,
estatelando-se no chão da ampla calçada lá embaixo ante os pés dos curiosos de
plantão.
Shantiti
gostava de dias claros, sem nuvens nem chuva, sem frio. Nas noites ou nas
trevas, ela mergulhava em pesadelos sedutores, nos quais os gozos mais
sofríveis, porém mais sinceros, eram “realizados”. Na luz, Shantiti era uma
pessoa deprimida, mas satisfeita e confortável por dentro. Mas Shantiti não
podia controlar o ciclo claro-escuro, por mais que tentasse. E ela nunca
desistiu de tentar. Nunca.