terça-feira, 9 de agosto de 2011

Os Planos de Um Suicida - Relbier Oliveira

Esse instrumento é o Oboé... Bem, já não me importa mais a luta por fazer sentido. Olhe onde estamos. Olhe bem para onde estamos indo. Gosto da suavidade do som. É uma melodia triste, melancólica. É Bach?! Gosto de Bach. Aquele era o meu fundamento: uma estranha luz alaranjada, quente, confortável: pacífica, como nossa cama em manhã fria, quando temos que acordar logo cedo para mais uma das várias obrigações que tomamos ou que se impõe a nós. O que estou fazendo agora? Jogo xadrez online com um velho desgraçado que, sabe-se lá Deus o que está fazendo mais, leva um ano para fazer uma jogada. Minhas jogadas, como sempre, são irrefletidas. Não levam mais que 1 minuto. Daí então o jogo passa a ser um tédio. Eu só sei mover as peças, costumo dizer. De minha perspectiva, esse jogo consiste em dar o máximo de trabalho possível para seu adversário capturar o seu rei. É a visão do rato: ele nunca está em vantagem. Falar essas coisas sem sentido é tão mais sincero conosco mesmo. Deixar a imaginação fluir, contando as besteiras que seus dedos e sua consciência tentam acompanhar. Bem ditos sejam os surrealistas! (Fiz de propósito).

É engraçado como nos acotovelamos nos ônibus e em outros espaços públicos e/ou coletivos. Digno de deixar qualquer cristão entristecido. Ou qualquer um que, direta ou indiretamente, consciente ou inconscientemente, fundou seu conjunto de valores, a construção do seu mundo, em cima de valores que, em qualquer (boa) medida, considera o humano. Não é estranho que qualquer coisa haja por necessidade, por implicação de alguma determinação anterior a ela, e assim por diante. Movemo-nos sempre por nossos interesses. Por que o sal de cozinha se dissolve de tal forma igualitariamente no meio aquoso? Por que a água do rio corre para o mar (ou, antes, para os lugares mais “baixos”?). O que significa o tal arco-reflexo de nosso corpo? O que é a fome, ou aquela sensação que nos incomoda a barriga? O que significa se remexer na cama durante a noite em busca da “melhor” posição? Onde estão as determinações mais íntimas, mais específicas? Aquelas, que não damos conta de apreender e compreender, e na qual armamos um circo de possibilidades? Entristece-me profundamente quando os valores das pessoas começam a se encrudecer, a criar forma, a se constituir. Pois então o mundo delas se forma também, e tudo o mais, todas as possibilidades, desaparecem. Tudo passa a responder mecanicamente ao padrão doravante estabelecido. Quero que descubram um dia que, de fato, eu não era belo, mas também que ninguém era mais belo do que eu. Quero que vejam que toda beleza que são capazes de encontrar no mundo, encontrariam também em mim, assim como todas as feiúras. Sabe por que eu gostava de Dragon Ball Z? Por que nele existiam espaços que não tinham donos, pessoas que eram diferentes e tinham suas diferenças respeitadas e consideradas. Identificava ali traço de humanidade, qual seja, a possibilidade na diversidade. Plano de Imanência... Fala sério, essas coisas todas eram invenções do Orlandi (e de quem em quem ele realmente viu sentido: qualquer um, menos Deleuze propriamente).