quinta-feira, 19 de julho de 2012

Querendo Sentir - Relbier Oliveira












Na calada da madrugada rotineira
faço versos “Bon grado” sobre coisas que sinto
e na ponta da parábola côncava
escrevo o que sinto verdadeiro,
– ou não! Mas sinto:
Vagas vaga-lume. Puta que o pariu.
Venha, oh neblina
Fecho o vidro, pois é fumaça da olaria
Sinto o vento em meu ouvido
Na verdade é um zumbido
De um pênis-longo fêmea querendo me picar
Sinto a cria querendo sair
Pra ver se a luz do dia é clara como eu dizia
Canalha! Fanfarra! Safada! Paulada!
A fadiga me pegou
Salve-me ou ignoro-te
Chupa-me ou provoco-te
O fim desse poema é o todo sem sentido
Pois num momento tão convexo
Cai na mesma depressão
da qual havia partido.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

E-mail a um mundo moderno - Relbier Oliveira


Supondo que você recebesse e lesse os e-mails que te envio, queria perguntar-lhe o que pensas a respeito das pessoas deste mundo. Às vezes, as acho todas doentes, eu mais doente que todas. Uma doença espiritual, da alma. Uma dependência tamanha uns dos outros. Um apego, ao mesmo tempo em que um culto à praticidade da vida. Um sentimentalismo exagerado, que reflete a falta de inteligência emocional: sofremos mais de dores da alma, dores "virtuais", do que de qualquer outra. Mas, como disse, sou mais doente que todos. Eu, do alto da minha doença, penso mesmo existirem pessoas distintas (e eu, uma delas). Penso que é possível formar um time de seres humanos, estes enquanto algo muito em falta no estilo de vida que levamos atualmente. Há tempos que os pontos de referências de nossa existência estão fora de nós. Não há mais um culto a um espiritualismo, ao que é propriamente humano – não se referindo necessariamente a um espiritualismo místico, mas antes fosse! À bem da verdade, isso tudo dito é conversa. Quero apenas estar perto das pessoas que me façam me sentir bem. Novamente, do alto de minha doença, creio poder identificá-las, às vezes assim sem mais, sem que elas tenham dito sequer uma palavra. Por que, afinal, acreditei que você pudesse ser uma destas? Não sei. Só sei que, como já disse exageradas vezes, sou também doente, e isso é tudo. E se você fosse mais sã que eu, não responderia: escaparia; fugiria para longe. Senão, Prove-me do contrário e lhe darei um beijo!


Fique em paz!
Relbier Oliveira.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Apologia - Relbier Oliveira

Não me lembro exatamente a data. Um dia, no finzinho da tarde, sai de uma aula na Unicamp e, como de costume, fui bandejar. Neste dia, sentei-me na mesa de costume. O bandejão estava cheio e, por isso, inevitavelmente acabei me sentando de frente para um estranho sujeito. A estranheza dele não estava na forma de se vestir, no seu corte de cabelo ou em sua aparência física. O fato é que ele estava visivelmente nervoso. Suava bastante. Estava trêmulo e consternado. Parecia sentir um profundo incômodo. Cabisbaixo, não ousava encarar-me ou a qualquer outro ali próximo, como se fugisse de nós; como se fossemos, na verdade, o motivo de todo o seu desconcerto. Curiosamente, ao deixar a mesa para ir embora (deixando praticamente toda a comida na bandeja), ele, sem me olhar nos olhos, pegou sua sobremesa (lembro-me perfeitamente o que era: uma maria-mole) e a estendeu em minha direção, e disse: "quer pra você? Eu não vou comer". Como não tivesse repertório melhor para esboçar naquele momento, simplesmente aceitei, sem entender muito bem o que, afinal, estava se passando. O fato é que fora a primeira e talvez última vez que eu via aquele rapaz. Era um jovem, talvez uns 17 ou 18 anos. Como fosse início do primeiro semestre, julguei tratar-se de um calouro que não conseguira ainda adaptar-se muito bem ao ritmo da universidade. Obviamente, era bem mais que isso. O fato é que, na saída do almoço do dia seguinte, por volta das 12h30, qual não foi minha surpresa ao me deparar com uma cena no mínimo um tanto inusitada, sobretudo dentro da universidade. Junto ao pé da torre da caixa d'água do ciclo básico (aquela ao lado do PB, onde antes funcionava a Rádio Muda) pude ver perfeitamente um corpo estirado coberto com um pano branco. Muitos curiosos ali presentes, inclusive eu, que me aproximei um pouco para tentar entender aquela cena destoante. Não sou de curiar tragédias, mas esse caso era excepcional. Talvez fosse um conhecido meu, eu precisava saber. Não, não era. Por sorte... Não sei se devo dizer isso: quanto egoísmo! Comentavam a assistentes sociais, ali presentes, entre si: "Ele veio nos procurar. Não imaginava que ele fosse fazer isso". Depois soube que se tratava de um aluno da história. De fato, recém-ingresso. Relembrar esta história ainda me causa tristeza. Penso comigo "seria ele na noite anterior, acossado pelo desespero, no bandejão?". E se fosse, aquele gesto de oferecer-me sua sobremesa seria um gesto de socorro? Haveria algo que eu pudesse ter feito? Nunca saberei. Outro dia, talvez na mesma semana, encontrei numa das entradas do IFCH (aquela da cantina, de frente com o gramado do ciclo básico) uma folha de caderno com escritos desconexos cujo tema central era a tristeza, a desesperança em relação à vida e ao mundo, e uma grande estima à morte. Não perco de vista que estes três acontecimentos possam na verdade serem só tristes coincidências, e o rapaz da maria-mole ainda estar vivo, e o dos escritos suicidas, por sua vez, já ter superado sua fase romântica e hoje estar às voltas com a tragicidade da realidade do mundo moderno. Não sei. Talvez nunca saberei. Tenham relação ou não, o fato é que, por muito tempo, esta história toda mexeu comigo. Raras vezes a compartilhei com alguém (infelizmente, não sou muito de me abrir com os outros; menos ainda se o assunto for de tamanha tragicidade). E, como já foi dito outras vezes, em outros momentos, são os excessos de sentimentos que movem minha capacidade criativa. Dessa forma, todo este quadro certamente influenciou muitas das minhas composições, como, por exemplo, a que segue abaixo, escrita pouco tempo depois destas experiências. Quero deixar aqui registrado que esta história do suicídio do estudante na caixa d'água, bem como a da outra estudante, que se jogou da janela do banheiro do ônibus que levava uma turma para uma viagem de campo, ainda são tidas por lenda, porque, de algum modo (e por algum forte motivo), tais fatos são abafados. Em relação à história da estudante, não posso afirmar que tenha mesmo acontecido. Deste caso do estudante, porém, fui testemunha.

Disperso?
Divago?
Triste?
Não sei
Incompleto?
Descrente?
Carente?
Talvez
Um pouco louco?
Autocrítico? injusto consigo?
Pode até ser
Não sei
Sem base?
Insuporte?
Trêmulo?
Inconsistente?
Bem sei
Doente da mente?!
— seu cu!
Indiferente com a mente da gente?
Estranho do que se acha ao que se é?
Isto é!
Do pau do Zefo à base não são segundos
É uma vida
Da janela do quarto ao chão da avenida
De uma bala na agulha a um singelo jazigo
Da superdose à overdose
Da navalha a um simples corte
Da janela do ônibus ao chão da rua
De um pára-brisa quebrado ao asfalto
Esfolado (também!)
Do fogo à carne viva
Da água à asfixia.
Não sorria sua ironia:
Era uma vida.
Não repreenda a verdade
Havia razões
Não vês? Está dado.
Não chores à toa
E não morras também
Silêncio.
Um momento.
Reflexões, ilusão.
Uma tristeza
Um descontentamento
E eis um clarão
Um lampejo
Um insight:
A vida continua?
Mas, como, se se passou uma vida?
Para isto há razões
Bem como houve para aquilo
O que é está dado
E é só isso




sábado, 2 de junho de 2012

Pai..- Arnaldo Silva



Hoje perguntaram por ti, meu pai
Usei palavras da razão para dizer que estavas bem
Desejando crer que realmente fosse verdade
Sinto falta de ver tua barba branca por fazer
Nossas conversas sempre foram tão incompatíveis
De tão cruel que a vida te foi
Tu me falas de realidades inexistentes
Eu teimo em te buscar destes sonhos
Para que não sofras ainda mais
Eu te falo da minha rotina diária
Da minha luta em busca de coisas que desconheces
Que as vezes acho que nada representam
Diante da vida, da felicidade…
E tu sorri, acreditando que teu filho é feliz
Por ter, por menor que seja,
Um caminho, uma estrada, um objetivo
Formação, trabalho, família, amigos
Há se soubesses como as vezes tudo parece fútil
Convivo com pessoas tão frágeis!
O que me sobra é sugar o que tem de melhor:
Amizade, desejo, fantasias ou quem sabe o amor
Fizeste aniversário e não pude falar-te
Ou abraçar-te para sentir-te
É tudo tão triste o que sinto
Muita vontade de chorar
Um choro solitário, incompreendido por outros
Que não nos compreendem ou não te aceitam
Não sabem o que já vivemos nesta vida
Eu e tu; tu e eu; filho e pai; pai e filho
As vezes conto tuas histórias
Escrevo contos pensando em ti
São tantas saudades que me pego
Ousando estar sempre te esperando
Pronuncio tuas frases prontas, tuas idéias
Para te manter mais perto de mim
Sabes que te compreendo
Sabes que somos iguais
Sabes que sou teu filho
Sabes que és meu pai
Sabes que eu ti amo para sempre

quinta-feira, 31 de maio de 2012

Eterno Inimigo Íntimo (O Avesso de Mim Mesmo) - Relbier Oliveira


Venha e me leve!
Neste dia em que me vejo de novo acossado pelo mal de há muito
Meu maior inimigo nunca esteve em outro lugar
senão em mim mesmo
Ingerido quente. Assim preto, forte
porém doce
Ou enfiado pelas contingências ambientais
Venha e me leve de volta ao Inferno!
Uma série de desfortunas me trouxe você de volta
Devo abraça-la, com a minha mais verdadeira hipocrisia?
Não se recebe de volta quem nunca foi embora
Entrou e me jogou na cara toda a solidão inerente
Sacudiu o tecido dos meus bons modos
e me remostrou o quanto sou feio
Não aprendi a admirar a minha imagem no espelho
A não me identificar com o que não seja o falso que criei
e não me reconheço
Vivo a esquizofrenia da não auto-aceitação
A realidade oprime; minha subjetividade, idem
Não vislumbro descanso nem na morte
E só vivo para buscar superação
porque a existência é eterna
– Afinal, nunca a experienciei de outro modo.
Sim, podes voltar a dormir em seu velho leito
Porém, até o fim desta eternidade
terás  de ter ido embora.

terça-feira, 29 de maio de 2012

As Lembranças - Relbier Oliveira


Passa o tempo, gasta-se a vida, sobram lembranças.
A nostalgia não é uma fraqueza, e sim o cômputo da existência.
Não se quer voltar atrás, mas somente apreciar os pontos belos do caminho.
A transformação biopsicossocial nos força a abandonar a magia:
só nos sobram as lembranças, só nos sobra solidão.
Mas agora, passa-se a vida e gasta-se o tempo.
Tudo fica preto e branco
Assim, sério; assim cansado
Assim embriagado e entediado
Assim, sem graça-ingênua
(porque senso de humor é fuga despropositada:
vazia, fria; sem sentido: sem graça)
Apoiado o desprezo ao saudosismo ao tempo de infância!
Da velha casa, quero apenas os velhos planos
Quero a curiosidade de se ver o simples
e de tirar dele um universo de possibilidades
Quero o tempo sem valor monetário, sem valor ocupacional
Quero a vida como nada que precisasse de uma filosofia de tédio para explicar
A vida com delírios próprios, delírios meus
A Lagoa Azul ingênua, perene
Sem se preocupar com o eterno
por não considerar começo ou fim
Mas percebendo que o para-sempre era aquele agora
que agora se foi
E jaz, para sempre, na memória e na lembrança
Num sentimento quente no fundo da alma
Numa existência já sem tempo e já quase sem vida
mas, para sempre, memorizada.
(Domingo de Páscoa, 2012)