Um blog para todos e todas publicarem suas poesias, artigos, historias e contos esquecidos em gavetas e entregues às traças. Aqui eles serão lidos e cumprirão enfim sua finalidade. Além disso, postaremos adaptações de livros para o cinema, as quais serão disponibilizadas para download.
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É preciso
amadurecer o suficiente para poder falar de amor. Entretanto, mal me sinto
maduro sequer para falar!
Desejo
uma mulher como nunca desejei nenhuma outra. Sinto necessidade do seu espírito
e da sua companhia, do seu calor, do seu cheiro e do seu toque, mas me sinto ainda
menino. Falar-lhe sobre o que sinto é contar que vi um ninho de formigas a um
astronauta: era tão belo, tão encantador, tão revelador, mas era apenas um
ninho de formigas, afinal. São dimensões igualmente grandes, apesar de relativamente
diferentes. Uma mulher deve certamente esperar mais que um ninho de formigas,
ainda que este possa ser tão grande quanto o mundo. Como potencializar o que
temos de ingênuo e puro sem perder a ternura (jamais)?
“Eu
te amo” é vago, correndo o risco de ser vazio. Mas eu te amo, poxa! Por que não
consigo dizê-lo a você, se é tudo o que tenho de mais sincero para dizer? É que
temo perde-la, e a mantenho ao preço de uma alma sufocada, a minha, calada por
meias verdades que teimam perigosamente em sair pondo tudo a perder: o homem
que por elas sai de minha boca, mas que não sou eu. Eu sou menino.
Um
homem não se troca pelo que não terá por medo de perder o que não tem. Antes a
certeza de ter perdido que o remorso de nunca ter tentado. Preciso fazer com
que esse homem que vos fala saia e conquiste efetivamente o mundo, ou que, se
não, morra tentando, mas que deixe de se esconder por medo de perder o que, de
fato, nunca teve. O império da fantasia está ruindo; o apelo da realidade é
mais forte. O efeito do tempo torna mais melancólico os personagens criados, e
isso é cada vez mais insuportável: o homem precisará sair se não quiser morrer soterrado. Terá de repossuir o seu velho corpo consumido pela ilusão e
transformá-lo num guerreiro, um lutador, e marchar para a reconquista da
realidade.
De
fato, o amor transforma. A ameaça de perdê-lo quando não se o tem é tão pior
quanto perdê-lo quando se o tinha. É que a fantasia potencializa a dor.
Sim,
por amor. Por amor é que o menino resolveu mudar. Por amor é que o menino
resolveu tornar-se homem. Por amor abandonou o seu mundo de felicidades opacas
em busca da cor mais viva quanto possível. Por amor aceitou pôr tudo a perder a
valer. Por amor ele se expôs a isso. “Mas, o que é esse tal amor?”, cabe a
pergunta. Isso ele ainda não sabe realmente. Resolveu colocar a fantasia à
prova para testar se de fato o amor existe. E, se constatar que ele não existe,
não terá mais para onde voltar. Terá de aprender a ser um vazio homem prático,
e desejar, enquanto espera, que a chegada do desconhecido lhe confira uma nova
chance. Porém, também o império do desejar será nesse momento tido apenas por
ficção do espírito. Então só lhe restará a realidade. Que ela não seja para ele
tão dura!
Se eu te pedir
de volta, você me devolve aquilo que na verdade nunca foi meu?
Foi
pensando nisso que Santa despertou de um sono cujo sonho lhe parecia real,
embora não se lembrasse de absolutamente mais nada a respeito dele. Chegou até
mesmo a pensar que sequer tivera tido um sonho, que aquilo fosse apenas mais um
dos infinitos fenômenos inexplicáveis. A hora? De que importava, afinal. O fato
é que ele sentia apenas que queria e deveria ficar mais tempo na cama. Mesmo
assim, levantou-se. Sempre achava curiosa a sensação do instante do assimqueacorda. Salvo os
casos em que despertava por já não suportar dormir ou ficar deitado um segundo
mais que fosse, de resto, o sono do despertar era sempre um tipo de confusão
existencial: não importava o que havia sido nem o que viria a ser há dali a não
muito tempo; sentir a água morna cair sobre o seu corpo atordoado, e percebê-lo
pouco a pouco se encaixando naquilo que ele sabia que, dali a não muito tempo,
ele seria. Nesses momentos, ele queria escrever. Era precisamente quando o seu
coração começava a bater mais depressa. Seus olhos perdiam aquela expressão da
depressão emocional do instante. Logo já estava se tocando com mais vivacidade,
admirando as próprias curvas e definições do corpo que, mais tarde, na maioria
dos outros grandes momentos, ele sabia ou pensava que sabia não tê-las. Era gordo,
era magro. Era forte, era fraco. Era alto e era. Era. Era belo, mas a maior
parte do tempo era feio, porque sempre se convencia de que era feio. Não tinha mal
hálito, mas se preocupava sempre com isso: era o medo de ser tão desagradável
quanto as pessoas desagradáveis que conhecia. O fato era que às vezes fazia
tudo errado quando tentava impedir que tal acontecesse. Não eram raras as vezes
em que, estando em casa – e dela não tendo necessidade alguma de sair –, ele
negligenciasse a escovação de seus dentes, e passasse o dia sem fazê-lo, ou
qualquer outro ato de higiene básica. E oscilava do ânimo que o paralisava ao
desânimo que o consumia. E não deixava de pensar no futuro, determinado pelas
consequências de todas as suas (muitas) fraquezas: precisava corrigi-las,
precisava ser uma pessoa melhor. Mas não conseguia. Dia após dia, traçava
ansiosamente planos de ação no sentido da auto-superação, mas esbarrava sempre
no sinal básico de qualquer operação: a realidade é bem diferente do que
pensamos. Isto é princípio, é constante. Santa queria ser feliz. Santa queria
ser amado. Santa queria se casar com alguém que ele amasse muito, e que esse
alguém o amasse tanto ou mais que ele. Que tivessem filhos e tranquilidade
financeira. Que ele pudesse fazer o que gosta e se relacionar bem com todas as
pessoas. Santa queria ser respeitado, lembrado, querido. Santa queria ser
admirado. Santa estava infeliz.
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